Cristina Correia - Consulta de Comportamento para Animais de Companhia

 

Caso Clínico

INTEGRAÇÃO DO NOVO BEBÉ

 

O nascimento de um bebé implica a chegada de um novo elemento ao grupo familiar e é, frequentemente, uma situação stressante, quer para a família quer para o animal existente em casa. A ordem social já está estabelecida na sua “matilha” e o novo elemento irá destabilizar essa ordem. Por isso é importante adoptar algum tipo de procedimentos que irão facilitar a integração do novo bebé.

Não se esqueça que nunca deve deixar o seu animal de estimação com o bebé sem supervisão, não porque o animal possa ser agressivo mas sim porque pode saltar inadvertidamente sobre a criança, quer por brincadeira quer por curiosidade. Até que a criança tenha idade suficiente para saber lidar com o animal (o que pode ocorrer só quando ela atingir os 10 anos de idade), é conveniente estarem sob supervisão.

 

1º Passo

Antes do seu bebé nascer, habitue o seu animal a um horário e ritmo de vida que possa manter após o nascimento da criança - que inclua a hora de passeio, alimentação, brincadeira, etc. Estes horários podem ser radicalmente diferentes daqueles a que o seu animal estava habituado, e por isso é conveniente que pense nisto e que as alterações sejam feitas antes da chegada do novo elemento. Inclua nesse horário 5 a 10 minutos em que se dedica exclusivamente ao seu animal –será o seu “tempo de qualidade”. Neste tempo deve acaricia-lo, pentea-lo, falar com ele, brincar com ele e com brinquedos, etc.

 

Independentemente de tudo o resto, esta escala deve ser mantida e deve delinear tarefas que possam ser feitas durante a presença do bebé. Durante o período de interacção com o animal, é importante que se a criança chorar haja alguém que se ocupe dela e que não tenha de interromper a brincadeira com o animal (a não ser que ele apresente sinais de instabilidade devido ao choro). Pode associar este tempo ao tempo de descansar - sentar-se com o seu cão para pentea-lo e “desabafar” com ele, são bons exercícios de relaxamento.

 

Quando fizer o “horário” para o seu animal seja realista e não se sinta culpada relativamente ao tempo de permanência com ele. Os 5 ou 10 minutos de atenção que lhe possa atribuir de uma forma continuada, é provavelmente mais tempo do que aquele que lhe dedica actualmente de modo continuado. Pretende-se que este tempo, embora pouco, seja exclusivamente para ele. É preferível pouco e bom tempo, do que muito e sem lhe dar a atenção a que ele estava habituado. O importante é que o animal continue a sentir que tem importância no seio familiar e que mantêm a sua posição hierárquica.

 

Tenha em atenção que se tiver mais do que um animal, deve reservar 5 a 10 minutos para cada um, individualmente. Se tiver animais que se dão particularmente bem, pode arranjar brincadeiras conjuntas, no entanto será mais difícil dedicar-se a cada um como eles necessitam.

 

2º Passo

Se o seu animal ainda não aprendeu a “passear”, é altura de ensina-lo, uma vez que agora ainda tem tempo disponível! Andar “junto” e obedecer ás suas ordens é fundamental para que possa, posteriormente, realizar passeios com ele e com o seu bebé, durante os quais o seu animal se porta convenientemente.

 

Pode fazer um Treino de Obediência recorrendo a uma coleira-cabeçada (Halti, Gentel Leader) ou passei-o com um harness que facilita o controlo sobre ele. Deste modo, pode ter a protecção, a companhia e realizar o passeio do seu animal, enquanto também está com o seu filho. Além disso, se conseguir ter presentes o seu cão e o seu bebé em simultâneo, mais depressa ele irá reconhece-lo como membro da sua “matilha”.

 

Embora seja desadequado falar de “ciúme”, é obvio que o seu animal vai sentir, após a chegada do bebé, que a atenção que lhe era dada é agora “distribuída” por outro ser, sendo natural que ele comece a exibir comportamentos de chamada de atenção. Por isso, preparar essa chegada e, posteriormente, executar tarefas que envolvam os dois – cão e bebé -, levará a um melhor relacionamento entre ambos.

 

3º Passo

Antes do nascimento do bebé, deixe o animal explorar o novo quartinho e as novas coisas. Estas zonas, e os objectos, têm novos cheiros que são interessantes para o seu animal. Deixe que ele se familiarize com esses cheiros. Para isso utilize e deixe-o cheirar as loções, pós de talco, colónias, etc., antes do nascimento do bebé.

 

Faça um Treino de Dessensibilização Sistemática e Contracondicionamento aos novos sons que irão existir em casa.

 

Se o animal tentar levar algum objecto do bebé, diga-lhe um forte “não” e peça-lhe que devolva o objecto. Se ele não devolve, é altura de lhe ensinar “boas maneiras” tais como “senta”, “fica”, “deita”, “larga”, “dá”, etc. Se o seu animal não obedece antes da chegada do bebé, poderá vir a ter sérios problemas de controlo sobre ele. È altura de fazer um Treino de Obediência.

 

Não deixe que o cão se habitue a dormir no quarto do bebé ou sobre alguma coisa que posteriormente não será permitida.

 

Tenha também em atenção se os brinquedos do seu cão são semelhantes a brinquedos de bebé, pois isso pode fazer com que mais tarde ele leve ambos para brincar. Se isso acontecer, caso os brinquedos sejam bem lavados não há indicação nenhuma de que isso possa afectar a saúde da criança; o perigo consiste no animal puder tentar tirar um brinquedo da mão da criança e, sem querer, magoa-la ou assusta-la. Por isso, o ideal será que os brinquedos do seu cão e do seu filho sejam visualmente diferentes – com diferentes formatos, texturas e sons associados.

 

Se o seu cão obedece ao “senta”, “fica”, “toma”, “dá”, como desejado, pode utilizar estes comportamentos para ensinar o cão e o bebé a interagirem, numa fase precoce de convivência.

 

4º Passo

Após o bebé nascer, peça ao seu marido (ou à pessoa que ficou a cuidar do animal durante o tempo em que está na maternidade), para levar para casa roupinhas que o bebé tenha usado, e deixe que o animal as cheire. Deixe as roupinhas pela casa para que ele possa explora-las – isso irá ensiná-lo que esse novo cheiro faz parte da família.

 

Se o animal tiver estado noutra casa durante a sua permanência na maternidade, é importante que ele regresse antes de si. Estar novamente em casa fará com que o seu nível de ansiedade diminua. Para além disso, se quando ele chegar a casa estiver lá o bebé, pode associar o seu estado de ansiedade e nervosismo à presença da criança.

 

5º Passo

Quando regressar a casa, é melhor que tenha ajuda. Alguém deve segurar no seu bebé quando cumprimenta o seu animal, pois ele teve saudades suas e é provável que lhe faça uma recepção efusiva. Por isso é importante que lhe dê atenção sem estar preocupada em o mandar embora. Se ele saltar, deve permanecer com ele até que o seu comportamento acalme. Lembre-se que esteve ausente e que isso o deixou muito ansioso.

 

Quando for apresentar o bebé ao animal, deve usar harness e trela curta. Esta apresentação só deve ser feita quando o animal estiver totalmente calmo e quieto, e o ambiente tiver voltado a um estado de normalidade. A “apresentação” deve durar 15 a 30 minutos.

 

6º Passo

Após o momento inicial de euforia ter passado, é a altura de fazer a “integração formal”. O seu esposo (ou a pessoa disponível para a ajudar) deve sentar-se confortavelmente com o bebé ao colo enquanto a mãe é responsável por controlar e monitorizar o animal. Enquanto fala com ele calmamente e o acaricia, deixe que o seu animal explore e cheire o bebé; se ele fizer algum movimento brusco deve ser puxado pela trela (e harness).

 

Lembre-se de permanecer calma durante todo o tempo. Uma lambidela ao bebé, pode ser aceite, mas é preferível que lhe diga “não”. Se ele rosnar, mande-o parar verbalmente, mas não utilize punição física (o que só irá aumentar o nível de ansiedade já sentida e pode levar a uma atitude agressiva por medo e/ou dor). Se ele não obedecer, ponha-o noutra sala, onde deve permanecer até que o seu comportamento de excitabilidade esteja completamente extinto.

 

Se ele rosnar, não o acaricie nem lhe diga que “está tudo bem”, pois na realidade não está! Se o fizer, estará a reforçar positivamente o comportamento de rosnar (Principio de Condicionamento Operante, Skinner), o que fará com que esse aumente de frequência e, possivelmente, também de intensidade. O animal deve aprender que para obter a atenção da dona deve permanecer calmo e comportar-se de um modo adequado relativamente ao novo elemento da família.

 

Não segure nem balance o bebé em frente do cão. A percepção que ele tem da criança não é a normal e isso pode leva-lo a investir sobre ela. O contacto deve ocorrer em circunstâncias normais (com o bebé ao colo de outra pessoa).

 

Se não houver mais ninguém em casa, pode fazer esta “integração” tendo o animal com a trela fixa a um móvel, a uma distância que lhe permita cheirar a dona e o bebé mas não saltar, caso tente. Deve continuar a elogia-lo verbalmente.

 

Em ambos os casos, se tiver dificuldade em que o animal obedeça ás suas ordens, pode recorrer a uma bisnaga de água. Quando o animal tiver uma postura agressiva ou rosnar, borrife-o com água no focinho, o que irá fazer com que ele interrompa o comportamento (punição não invasiva). Sempre que ele estiver a ter um comportamento adequado (cheirar calmamente o bebé, investigar), deve reforça-lo positivamente, com elogios verbais e carinhos.

 

Nunca deve gritar com o animal, assusta-lo ou bater-lhe, pois isso só irá fazer com que ele associe a presença do bebé a “acontecimentos maus”. A correcção do comportamento deve ser feita de forma não invasiva e nos primeiros 30 segundos em que ocorre, devendo por isso estar atenta aos sinais emitidos pelo animal (tenha em atenção o olhar, posição das orelhas, pêlo).

 

7º Passo

Se durante as primeiras semanas estiver em casa sozinha com o seu bebé e o seu animal, este deve ser preso com trela a um local fixo, pois é impossível estar sentada com o bebé ou a tratar dele, e prevenir que um movimento mais brusco do cão caso ocorra. Não se esqueça que o comprimento da trela deve permitir ao animal cheira-la, sem que no entanto consiga saltar sobre si. Pode também delimitar a área onde ele se encontra, colocando-o, por exemplo, grades de protecção para bebé (permitindo que ele esteja na mesma divisão, consigo, mas sem a puder atrapalhar).

 

8º Passo

Se após 3 semanas o animal já aceitar o bebé sem apresentar nenhuma alteração comportamental, pode deixar de o ter preso à trela. No entanto, deve continuar a vigia-lo e a supervisiona-lo. Nunca deve deixa-lo sozinho com o bebé. Mesmo que esteja com açaime (o que previne mordeduras), o perigo consiste em que ele salte e, inadvertidamente, magoe o bebé.

 

Se estiver com o seu esposo, é importante que na altura que tenha de tratar do seu animal, um trate do cão e o outro do bebé, indo alternando. O reforço do comportamento adequado do animal, deve ser feito ora por um ora por outro.

 

9º Passo

Se o animal não adoptar uma postura desadequada e se já está socializado com o bebé, não há motivo para não o deixar andar consigo pela casa. Quando está a tratar do bebé pode deixar que o animal esteja ao pé de si, o que também irá contribuir de forma positiva para a futura interacção da criança com o animal.

 

10º Passo

Em nenhum caso o animal deve dormir no quarto do bebé. È preferível que feche a porta do quartinho, deixando ligado um intercomunicador.

 

11º Passo

A aproximação do cão ao bebé deve ser lenta e gradual, e efectuada com muita calma. E, caso o animal evidencie sinais de agressividade ou agitação comportamental, essa integração deve ser ainda mais lenta (reveja os pontos 5 e 6).

 

A Agressividade Predatória é o tipo de agressividade mais frequentemente observada quando dirigida a crianças pequenas (pois estas são percepcionadas como “seres estranhos”, com cheiro, andar e vocalizações estranhas), enquanto que crianças mais velhas (entre os 18 e os 36 meses), que podem maltratar ou assustar o animal, podem ser vitimas de Agressividade induzida por Dor ou Medo.

 

Por isso é muito importante que desde cedo ensine a sua criança a lidar com o seu animal de forma adequada: não bater, não puxar o pelo, etc. Isto é especialmente importante se o animal já for velho e/ou estiver doente.

 

Para além de tudo o que foi anteriormente referido, sabe-se que o relacionamento precoce entre crianças e animais de estimação conduz a um desenvolvimento psicológico mais saudável e a um melhor ajustamento social. Saber dar e receber afecto, tratar e cuidar de outro ser vivo, é extremamente importante para o desenvolvimento harmonioso da criança.
 

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